segunda-feira, 30 de junho de 2008

Afoguei-me naquelas águas gaseificadas, cor de Coca-Cola e agora procuro desesperadamente por uma borbulha do gás rarefeito onde possa respirar pedaços de vida, uma procura é aquilo que me define, se sou aquilo que faço, então sou uma busca incessante por algo que nunca chegará aparecer. Porque de gula está o mundo cheio, e eu quis engoli-lo, achei mesmo que conseguia e entalei-me; para minha estranha existência coexistiu grande pancada no corpo e na alma. Há que dar ciclo àquilo que menos queria, há que continuar nesta maré de amores e desamores, o mundo é grande demais para só ter uma cor, mas eu não percebi isso, nunca tinha tentado sequer.
Apetece-me desesperadamente provar tudo, agora que o meu bem seguiu o caminho contrário sem retorno, perdi o medo de errar, se mesmo com ele errei, não sei da vontade, procurei-a por toda a parte e continuo sem realmente importar-me com isso.
Mergulhei-me no copo que bebeste, saíste satisfeito, embora soubesses que jamais me satisfarias, continuavas a deixar um resto para beber no fundo, para que esse perdesse por si todo o gás e que acabasse por desistir de ser bebido. Afinal, sempre conseguiste tudo o que querias, menos eu…Para variar um pouco; saí magoada.

sábado, 28 de junho de 2008

E todas as vezes que o ar se recusa a entrar para ser respirado e sugado, que o sangue anda mais devagar e arrefece, que a temperatura lá fora fica negativa, que tudo à volta fica invisível como se os nossos olhos só pudessem ter foco no medo e no pânico que percorrem o corpo como um rastilho de pólvora, esqueço-me que até consigo falar, pensar, reagir…
O mundo fica logo com outro significado, nunca mais me vou esquecer da minha filosofia de infância nesses momentos, fiquei marcada para toda a eternidade. Porque esse medo sou eu hoje, moldada com deficiências de alma, pequenas partículas que chocam com os valores da normalidade.
Lembro-me de enrolar-me nos cobertores enquanto ouvia o espectáculo gratuito por de trás do ranger e da azáfama de portas e outros objectos, às vezes até eram objectos um pouco maiores com coração e tudo. Nunca percebi como o amor poderia ser festejado desta forma, e ainda mais curioso, nunca cheguei a perceber como é que ele ainda se faz restar no meio do ódio e do rancor. A minha cama era quente, mas nunca o suficiente para me abraçar calorosamente e me fazer esquecer o que os meus ouvidos percebiam e o meu coração consentia. Não tinha irmãos, portanto, não tive mais ninguém para tomar conta, para abraçar nestes momentos e também nunca tive ninguém que me abraçasse e me dissesse que o mundo também tem outras cores. Tive de lutar por mim mesma, até conseguir fazer ver-me isso, pelo menos no sentido teórico, o sol iria aparecer no dia seguinte de qualquer das formas.
Enquanto me encolhia toda, tapava os ouvidos e semicerrava os olhos, sentia alguém maior, acima de mim, a prometer-me um futuro melhor, a mexer-me no cabelo e a garantir-me que tudo ia correr bem, mas ele nunca chegou a vir, sempre esperei na minha cadeira, rodeada dos desenhos fartos do meu pequeno quarto, mas ele nunca me chegou a cumprimentar.
Sinto que a minha vida é como uma passadeira, quanto mais corro, mais depressa vem ao de cima a regularidade de toda ela, quanto mais força faço, mais depressa me sinto entulhada com os ínfimos metros cúbicos a que estou predestinada, cada vez mais sufocante, mais insuportável e só emagreço em alma, porque cada vez me sinto mais farta de sentir, como se os sentimentos não esperassem sair de alguém de forma pura e verdadeira, sair só pelo simples facto de sair, como aquelas mães das classes baixas, a abarrotar de partos e filhos, percentagem numerosa de pobres coitados predestinados ao abismo. Afinal sempre tudo depende da sorte, sempre tudo depende do ventre que se ocupa, a decisão cabe àqueles que estão de fora, cabe ao mundo.
Oh, quero entrar dentro de ti, quero arranjar uma esquina para lá morar, para sempre, quero ser o órgão do qual não possas passar sem, porque contigo, estou bem, estou a salvo. Encontro em ti, todas as tonalidades que quero, jaz em ti o desejo e a acção da palavra. Obrigada. Se me coubessem todas as decisões, já tinha encontrado a felicidade.

terça-feira, 24 de junho de 2008








A repugnância relativamente à prisão incandescente que se tornou o meu quarto, a minha pequena e humilde casa, tem a ver com algo muito maior do que o desejo. E não é que a porta velha de madeira me fizesse cólicas com a sua cor arrojada do verniz velho, nem que as paredes cheias de rachadelas metessem dó, mas cresci sempre com o mesmo espaço. Sinto-me um animal preso na sua gaiola, como aquele pássaro que vi algures já não sei onde. Eu nunca quis escrever nada que se visse, nunca tive intenção de fazer das minhas palavras memórias tipo pontos negros que se encravam na mente esburacando tudo e desconcertando o pouco e único bom senso que percorre a carne, mas sempre me traíram.
Tenho sede do infinito porque quando a minha mão se encher e ficar cheia, tudo o resto será inatingível e incompleto, e as minhas mãos são pequenas, gostava de ser maior, maior que o Sol e que a Lua; quando era criança, acreditava que era maior que as nuvens só porque conseguia olhá-las e admirá-las com sentimentos bonitos e ingénuos, e que nenhuma estrela brilhava mais do que a minha própria existência e que aquele céu imenso falava comigo a qualquer instante e me sussurrava o quão eterna sou para alma dos que passam por mim e do mundo que sente os meus pés a massajarem-lhe as costas. Hoje, acredito ainda mais que essa eternidade é para durar, não fosse eu estar farta da minha existência.
Poderia estender a minha alma, desdobrá-la não esquecendo cada pedacinho de memória fracturada e tentar fazer uma estrada que me levasse até ti, como se todo aquele sofrimento e toda aquela felicidade fossem a chave para algum dia ter aquele dia com sabor a morango e maracujá.
Vim da rua de matar alguém, agora sinto a dor de ter matado alguém de ter sentido amor, e eu sou tão boa de amar, se em mim sentir que todo este sentimento vale a pena…Guardei mais um desejo no baú dos sonhos, pode ser, que um dia, no paraíso, me espere um dia em que te veja a sair do comboio com todas aquelas palavras que me prometeste e que me concretizes o meu eu do passado que morreu e subiu à mais alta torre do inferno, passou a carne em torno da moral e queimou-se. Curiosamente, a parte de mim que sobreviveu continua a viver dum dia que nem sequer sei se passará pelo calendário. É disso que respiro.

segunda-feira, 23 de junho de 2008

Rompe-se o orgasmo em uníssono dos lençóis mergulhados no suor de dois corpos manuseados pelo sentimento; as linhas e as formas fazem da palavra o silêncio que preenche cada poro dos intervenientes, os mortais, bem arranjados por sinal na sua convivência austera e fútil desenham apressadamente os seus destinos, como se a mão fosse o prazer e a dor misturados numa bebida vermelha cor de mel, e não seria a cor certamente, seria o sabor, seria o nada onde os sentidos se misturam pelo clímax das vidas em jogo.
Para eles, seria a morte, também, o mesmo apogeu daquela larga noite para sempre eterna no coração do mundo, no coração da madeira talhada da cama, nos lençóis suados e ressoados de toda aquela azáfama de corpos. Enquanto Deus lhes aguardava um pouco mais acima, conseguiam os cegos olhos visualizarem a divina imagem sobre o pecaminoso acto, jamais seria impensável que um ser humano desejasse outro fim.
A viagem chegava ao fim, não havia entusiasmo para continuar, avistava-se ao longe o porto de chegada, uma paragem coberta de cidades, de pessoas…de vida. E para o mortal qualquer tipo de vida é um medo, não foi para isso que foi predestinado.
E pior do que o silêncio audível é aquele que não se ouve por de trás do corpo, o silêncio solitário incurável de uma vida de penúria, a monotonia das palavras mal pronunciadas, das que saem por prazer e das que não deviam sair, das incontroláveis e das chaves de ouro, das falácias e das mentiras, das perversas às inocentes, das que se conseguem dizer e do que jamais poderá ser dito. E há tantas coisas que eu queria dizer-te, mas não sei como.
Queria escrever em pedaços de papel velho, aquilo que penso sem pensar…palavras rotas, quebradas, memórias distorcidas, lugares sem coordenadas, sonhos pesados, pesados demais, o cinzento de todos os dias, por mais que o Sol brilhe, cada dia, será sempre um dia a mais e toda esta viagem que parece não ter mais fim, sem qualquer orgulho na estadia, e o preço elevado da conta abarrotada de furos que o meu corpo paga a cada segundo, o apreço das responsabilidades que me acompanham à mesa, o descanso da nossa cama que nos abraça no leito que nos tem como uma criança desmedida, onde as lágrimas já não são fúteis e os sentimentos afiados como facas que cortam a carne do animal que nos sacia um dever físico incontornável; o céu coberto por uma noite estrelada que nos tenta desvendar o quão grande somos pela alma que temos, pelo espírito selvagem de uma liberdade singela da natureza virgem; a inocência no seu mais puro toque, com pitadas de sal do mar salgado. A beleza incessante do mundo em conflito com a crueldade da vida. O choque de gerações importunadas pelo peso das consciências marcadas pelo passado faz da esperança uma fonte esgotável e da morte um destino cada vez mais apetecível, uma grande e suculenta maça vermelha pendurada no cimo mais alto da árvore robusta chamada vida.
E alguém lá no fundo disse “Amor e empatia” e a escuridão opaca da esfera giratória cobriu-se de luz num descampado virgem.