Sou vítima de uma gravidez ambulante, de um cancro no colo do útero que se propaga pelo sangue chegando aos vasos capilares mais requintados e por sua vez mais discretos como se esses fossem o FBI num caso de extrema segurança e privação, em que não pudessem ser vistos e nem deus pudesse salvaguarda-los por nem sequer constarem na lista de mortais; o cancro vai morrer quando eu morrer, é uma vitória do corpo, um descanso da vida, e uma libertação da alma aprisionada ao corpo que não escolheu. Não parto sozinha em vão, mas acabo por matar toda a saudade que aquelas dores e coisas na barriga me deixaram. Parto, prenha por essa rua fora, grávida de ti, do mundo, de todas as palavras que engoli sem querer, como se me entalasse com um gole de água oferecido por uma pessoa que me despreza, vislumbro olhares que me olham fazendo o percurso com a íris dos meus pés à cabeça, parando nos meus olhos, observando de perto a minha expressão mais adulta e vislumbrando a barriga que não quer crescer.
Acabei por ter o meu filho há alguns dias atrás, vi-o nascer e florescer, cheguei a tocar-lhe no umbigo e decorei algures na minha memória, aqueles calções verdes, aquela barreira da distância e do amor que fazem para sempre paralelas no meu caminho. Aprendi, também que mentir é o melhor caminho para aqueles que não nos deixam respirar, a liberdade começa a ganhar a sua própria independência à medida que o segredo envelhece e se torna maduro, ganha forma e sai à rua ao lado do meu porta-moedas dentro da mala robusta comprada naquela festa na qual vivemos momentos felizes.
Para sempre serei um mártir daquilo que fui, está escrito em algum lado que jamais chegarei ao cimo sem que a escada anterior não me pareça insana, e não é que nunca me tenha envergonhado dos meus apetites, é só que à medida que a maçã vai sendo digerida na boca virgem, o segundo pedaço a trincar pesará sempre menos na consciência é tal e qual como a guerra mundial que começa numa briga de irmãos, uma briga de infância, uma disputa por um brinquedo, vai evoluindo com as idades, passa por uma briga de adolescentes, atinge a maioridade, dois adultos que disputam questões monetárias, passam pelos números ordinais e acrescentam gentes às pequenas batalhas, os números vão subindo a uma velocidade louca ate que envolve uma grande guerra com todas as gentes do mundo e mais algumas, por assuntos das quais as origens já não são bem recordadas e acabam por encher todos os jardins nutridos a carne podre e em decomposição com ossos à mistura de almas despedaçadas e corpos sem vida. E, depois, há sempre alguém muito gentil, que acha que não tem culpa no cartório e esculpe na pedra um doloroso e sentido “R.I.P” como se a última palavra fizesse qualquer buraco branco nas mentes guerrilheiras, o pior, é que a paz não é um morto que não sente, é um vivo que descansa.
E o amor só poderia explodir em mim desta forma, visto que eu nunca fui muito com ele no seu estado natural, faz-me um certo tipo de alergia, porque quase sempre me provoca dor de terceiro grau aguda, mas naqueles dias, misturou um sabor intenso a morango e maracujá na boca da maça vermelha que fez com que nutrisse um líquido alaranjado chamado felicidade, com um ponto alto de ebulição que fazia o sangue ferver e as veias corromperem, e o coração esse impiedoso ilusório batia como se não houvesse amanha, numa folia e adrenalina invejáveis…oh meu deus (seja lá quem fores) eu fui feliz!
domingo, 31 de agosto de 2008
quarta-feira, 20 de agosto de 2008
Amanha
Morri há alguns anos atrás e perdi peças do presente, as do futuro nunca chegaram a vir, e as do passado estão tão bem encaixadas que jamais serão tocadas, como se as coisas ficassem para sempre tal como acabaram, e agora que me encontrei durante este tempo todo, morri, para todos os dias acordar e reflectir que hoje é só um dia a mais do que ontem, e que tudo estará de volta ao seu ciclo vicioso do abismo inegável.
Renasci porque amanhã será um dia diferente, porque os deuses devotos deste mundo perceberam que havia qualquer coisa pendente na minha pessoa, e não era na minha vida porque essa certamente já se perdeu por esses recantos, o dia depois de hoje trará de volta um novo ar e conhecerei, ao mesmo tempo que sinto dois braços enrolados a mim, um novo eu, sem esquecer tudo o que fui, parto para uma viagem espiritual, não saindo do sítio, apenas ganhando a medalha de uma vida de luto parada no meu altar e vai ser o mesmo em que nos vamos casar em nome de um deus qualquer que estará entre nós dois, atrás e à frente e dos lados, nunca se sabe…Casamo-nos quando quisermos, mas hoje, hoje já não dá…
Renasci porque amanhã será um dia diferente, porque os deuses devotos deste mundo perceberam que havia qualquer coisa pendente na minha pessoa, e não era na minha vida porque essa certamente já se perdeu por esses recantos, o dia depois de hoje trará de volta um novo ar e conhecerei, ao mesmo tempo que sinto dois braços enrolados a mim, um novo eu, sem esquecer tudo o que fui, parto para uma viagem espiritual, não saindo do sítio, apenas ganhando a medalha de uma vida de luto parada no meu altar e vai ser o mesmo em que nos vamos casar em nome de um deus qualquer que estará entre nós dois, atrás e à frente e dos lados, nunca se sabe…Casamo-nos quando quisermos, mas hoje, hoje já não dá…
quarta-feira, 13 de agosto de 2008
"The Killer is me"
Vislumbrei por entre a vitrina da loja a embalagem de comprimidos milagrosos, era redonda e pequena, mas cheia, muito cheia por dentro, a abarrotar de efeitos secundários e de desígnios menos dignos e colorida, como se também os olhos pudessem tomar a dose necessária e viajarem para outra dimensão e talvez permanecer por lá em férias prolongadas até à eternidade, estava só, meia escondida por detrás de todas as outras caixas de medicamentos para a vida, que perda de tempo!, atrasar a morte é algo deveras grotesco , e muito típico do ser humano que cisma em atrasar tudo o que o tempo não pode vir a realizar mais tarde.
Olhei mais de perto para poder enviar ao meu cérebro o número exacto da quantia que tinha de cobrar para ser feliz, disfarcei como se tivesse também a olhar para outro preço, não vá a sociedade recriminar-me agora por ter uma pequena e inútil curiosidade, e de repente senti um” não” a percorrer-me cada vaso capilar, não o posso comprar, demasiado caro, e nem sei se algum dia conseguirei dar-lhes uso. Agora, preferia não ter visto nada, ter-me deitado a dormir e imaginar que estava onde eu queria estar, teria sido tudo tão mais fácil, teria sido tudo tão menos doloroso, mas há sempre retalhos que me obrigam a caminhar descalça pelo caminho mais longo, e desgastam-me os músculos e a mente, preciso de descanso, um terno descanso.
Se alguém disse que as férias são milagrosas, enganou-se redondamente; as férias não são mais que um fardo, um prolongamento do tempo que temos a sós, uma solidão tremenda entre a alma e o corpo que nos obriga a pensar em perguntas sem resposta e a deixar trespassar a tristeza compulsiva, há que ter sempre algo de baixo da manga e realizar sem qualquer pudor, tentando desligar os pensamentos insanos sobre a vida e as coisas, eu tentei, juro que sim, mas quanto mais tento, mais falho por simplesmente saber que o único objectivo destas tristes tentativas é mais uma tentativa de me deixar menos mal em relação a tudo. E se ao menos tudo fosse igual a ti, limpo e forte, insano mas verdadeiro em todos os ínfimos pensamentos, o mundo seria o paraíso e deixaria saudades. As coisas não tardam nada a voltar ao berço, a verdadeira avalanche ainda está para vir.
Olhei mais de perto para poder enviar ao meu cérebro o número exacto da quantia que tinha de cobrar para ser feliz, disfarcei como se tivesse também a olhar para outro preço, não vá a sociedade recriminar-me agora por ter uma pequena e inútil curiosidade, e de repente senti um” não” a percorrer-me cada vaso capilar, não o posso comprar, demasiado caro, e nem sei se algum dia conseguirei dar-lhes uso. Agora, preferia não ter visto nada, ter-me deitado a dormir e imaginar que estava onde eu queria estar, teria sido tudo tão mais fácil, teria sido tudo tão menos doloroso, mas há sempre retalhos que me obrigam a caminhar descalça pelo caminho mais longo, e desgastam-me os músculos e a mente, preciso de descanso, um terno descanso.
Se alguém disse que as férias são milagrosas, enganou-se redondamente; as férias não são mais que um fardo, um prolongamento do tempo que temos a sós, uma solidão tremenda entre a alma e o corpo que nos obriga a pensar em perguntas sem resposta e a deixar trespassar a tristeza compulsiva, há que ter sempre algo de baixo da manga e realizar sem qualquer pudor, tentando desligar os pensamentos insanos sobre a vida e as coisas, eu tentei, juro que sim, mas quanto mais tento, mais falho por simplesmente saber que o único objectivo destas tristes tentativas é mais uma tentativa de me deixar menos mal em relação a tudo. E se ao menos tudo fosse igual a ti, limpo e forte, insano mas verdadeiro em todos os ínfimos pensamentos, o mundo seria o paraíso e deixaria saudades. As coisas não tardam nada a voltar ao berço, a verdadeira avalanche ainda está para vir.
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